Estado lucra 450 euros com cada advogado oficioso

Justiça Arguidos condenados que tenham solicitado apoio judiciário pagam uma verba que vai para os corres do Estado.

Estado ‘lucra’ 450 euros por cada advogado oficioso em processos-críme
Apoio Judiciário. Na nota de custas entregue ao arguido condenado consta o valor de 1046 euros em sede de apoio judiciário. Ministério da Justiça fica com mais de metade (766 euros) e apenas 280,50 são entregues ao advogado.

O Estado cobra aos arguidos condenados – que tenham recorrido a um advogado oficioso – 730,50 euros em sede de apoio judiciário. Desses, 450 euros vão para o atual Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ) e só 280,50 euros vão para os advogados, pelos serviços prestados. Ou seja: no total, um arguido que seja condenado em tribunal singular (nos casos dos crimes com pena igual ou inferior a cinco anos) paga 450 euros ao Estado. Ao que acresce ainda a taxa de justiça penal de cerca de 306 euros. Manuel, engenheiro, foi levado por um agente da PSP, quando estava em sua casa, por suspeitas de maus tratos infligidos contra a mulher, com quem estava casado havia cinco anos. Apesar de não ter sido uma detenção em flagrante delito, todos os indícios apontavam para o suspeito de 30 anos. Este acabou por ser detido ao fim de duas semanas, depois de alegadamente terem sido cometidos os atos violentos.

O arguido pediu a nomeação de um advogado oficioso, o que foi feito pela Ordem dos Advogados (OA), conforme lhe compete. A despesa em causa, porém, acabou por ter de ser custeada pelo arguido, uma vez que este não tem direito a apoio judiciário (advogados pagos pelo Estado para quem tenha baixos rendimentos).

Assim, no final do julgamento em que foi condenado a dois anos e meio de pena de prisão, o engenheiro desempregado recebeu a nota de custas do tribunal: teria de pagar 1046 euros pelo processo (ver nota de custas ao lado). Mais de metade é canalizada para o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, 306 euros para o fisco e apenas 280,50 euros são efetivamente recebidos pelo advogado, como honorários.

Para onde vai o dinheiro?
Uma realidade denunciada por Elina Fraga, vice-presidente da Ordem dos Advogados e responsável pelo pelouro de apoio judiciário. “Há uma ilusão de que o valor de 450 euros reverte a favor do advogado, mas isso não corresponde à verdade”, explica em declarações ao DN. O valor de 280,50 euros consta da tabela da Lei de Acesso ao Direito que discrimina os honorários recebidos pelos advogados oficiosos em função do tipo de processo.
A tabela em causa define que um advogado que assuma a defesa de um arguido acusado de um crime com pena de prisão que vá até cinco anos, julgado em tribunal singular (apenas por um juiz), receba os tais 280,50 euros. Mas a fatia maior vai para o Estado, para “cobrir pagamentos de despesas por este antecipadas e não consideradas taxas de justiça”, explica a Direção-Geral de Política de Justiça, no site onde discrimina as custas pagas pelos cidadãos.

Em 2011, o IGFEJ recebeu 176 milhões de euros em sede de custas, pagas pelos arguidos condenados. “Nos casos de processos-crime, com tribunal singular, o advogado recebe 280,50, embora o arguido na nota de custas pague ainda mais 450 euros”, sublinha em declarações ao DN o advogado Paulo Lopes. “Para onde vai o resto do dinheiro?” questiona.
Questionado pelo DN, o Ministério da Justiça esclarece que “o valor de 450 euros constante da nota de custas do tribunal em processos-crime corresponde ao montante devido nos casos em que o arguido não solicita o apoio judiciário”. A nota enviada ao DN invoca a Lei n.° 34/2004, que diz que o arguido é responsável pelo pagamento do triplo do valor estabelecido nos termos do n.° 2 do artigo 36.° (150 euros).

Mais de 20 mil pedem apoio judiciário
Crise Só no primeiro semestre deste ano a Ordem dos Advogados (OA) recebeu mais 19 831 pedidos de defesas oficiosas – advogados pagos pelo Estado para pessoas com carência económica- comparativamente ao verificado no último semestre do ano passado.
No total, foram pedidos 123 014 advogados oficiosos e no último semestre do ano passado, 103 183. Uma despesa a cargo do Estado, pelo menos nos casos em que estes arguidos ou réus acabam condenados. Contas feitas, o Estado terá gasto, no máximo, cerca de 41 milhões de euros em advogados inscritos no sistema de acesso ao direito, mais seis milhões e setecentos e quarenta e dois mil euros do que no semestre anterior. Segundo o relatório europeu da Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça do Conselho da Europa (CEPEJ), cada processo de apoio judiciário custa ao Estado, em média, 343 euros.

As causas para este aumento estão relacionadas com a crise e com o consequente aumento do desemprego e das dívidas das famílias, e ainda com o crescente registo de roubos e furtos.

Porém, há casos em que a Segurança Social não consegue filtrar, que são as nomeações feitas para atender a casos sem qualquer argumento jurídico. Só o Conselho Distrital de Lisboa já registou cerca de 500 pedidos de uma só pessoa. Estes chamados viciados no apoio judiciário são cada vez mais, segundo registos da Ordem dos Advogados....

In: ASJP
24/09/2013

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